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depois de quatro anos afiando a lentidão das agulhas, dou à luz a andarilha edições, uma costureira de livros, caminhante desde o ventre recôncavo baiano.
nesse percurso, fui ensaiando maneiras para transbordar : do íntimo de pensar e fazer o próprio livro, para então, delicadamente, apreciar e cuidar do material de outras pessoas, encarnando-o em livro poético. o ponto primeiro deste fazer editorial eu já compreendia se tratar do livro como uma proposição conjunta ~ um processo colaborativo entre autor/a, editor/a, leitores/as. o exercício editorial partiria sempre da escuta e do alinhamento de pulsações estéticas ~ minhas e das autoras e autores.
o convite para a coragem veio em meados de 2019. Maíra Vale, escritora e antropóloga, companheira de andarilhagens poéticas e então colaboradora da editora, estava, naquele período, concluindo doutoramento em antropologia social, fruto de pesquisa realizada em Cachoeira – Ba. o convite-coragem foi para que eu editasse um livro a partir do terceiro capítulo de sua tese, onde está reunida uma série de contos escritos a partir de histórias sobre escravidão e espiritualidade afro-brasileira, desde o contexto cachoeirano, contadas por gente deste lugar.
surge então um livro mergulhado em verdeazul ~ do mais literal, ao mais imaginário ~ povoado de afetos e memórias. nasce Cachoeira & a inversão do mundo. nasce também a andarilha edições.
passamos o ano dialogando, planejando, experimentando, configurando enfim dois sonhos irmanados : a editora e sua primeira cria. Cachoeira, como em tudo o que transborda, é abundante e fértil ~ foi dela e com ela a viabilidade de pulsar para além, não somente registrando narrativas, mas potencializando meios para que elas circulassem aqui e acolá.
culminamos em dezembro nossos abre-caminhos ~ o final que também é sempre inícios. dezembro porque é mês de celebrar a fertilidade de nossas águas de fora e de dentro; porque também, de algum modo, é quando realinhavamos esperanças, sonhos, aspirações do passar-a-limpo; porque, afinal, é bom tempo para iniciar bons começos.
no dia 12, numa quinta-feira, nos reunimos no Cine-Theatro Cachoeirano, à beira do Paraguaçu, e lançamos ao mundo a andarilha edições e seu primeiro livro costurado. foi um encontro vibrante e precioso. Duca Clara foi nossa apresentadora; Melina, Pedro e Luiza, integrantes do grupo Rouxinol, leram trechos aperitivos dos contos; algumas personagens comentaram as narrativas que as envolvem, como o professor Raimundo Cerqueira e dona Lene, filha de mãe Dionízia, iyalorixá do Oiá Mucumbi; Paloma Santana fez intervenções sonoras, com algumas músicas autorais e um repertório com a cara do recôncavo baiano; a querida Gilvânia distribuiu seus saborosos acarajés.
em suma, foi uma noite calorosa e inesquecível ~ estava ali assinalado o nossos desejo de vida longa para a andarilha e seus livros sempre caminhantes.
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